IV Borborema Cangaço – Taperoá-PB
- Revista de Turismo PB

- 30 de mai.
- 3 min de leitura
Parei na calçada da Biblioteca Ariano Suassuna minutos antes do evento. Fiz uma viagem sentimental que transmudou uma série de impressões. Afinal, era ali o primeiro evento cultural que participava depois de um processo cirúrgico que me levou à unidade de terapia intensiva. Dali para frente tudo parece ter mudado, a alma transfigurada. Mutilei pensamentos, vontades, quimeras na construção de outras e deixei aquele vento gélido – comum das noites caririzeiras – tocar a pele e me envolver. Na lembrança me veio Balduíno Lélys, Pedro Nunes Filho, Manelito Dantas Vilar além do próprio Ariano e a magia do Mundo-Sertão. Ouvi o bafejar dessas vozes celestiais como a dizer: “bem-vindo de volta”. Me emocionei.
Olhei para o alto, a lua enchia em quase toda sua plenitude. As nuvens polvilharam o céu compondo um cenário mágico ao brincar com aquela luminosidade, pareciam tufos de algodão, lembrança no firmamento de um apogeu econômico desta terra. Espiando a calçada, vi os frontões de velhos casarões, alguns centenários, testemunhas do tempo e da história. Segui com o olhar até o fim da rua onde de dia é possível ver a indomável Serra do Pico, gigante rochoso sagrado que beija o céu daqueles Cariris Velhos, desafiando a lógica do tempo. Escondida na escuridão noturna, só se era possível sentir sua presença na paisagem.
Virei-me, encarei a iluminada Matriz de Nossa Senhora da Conceição dominando o outeiro, me benzi. Vendo aquele templo erigido na década de 1980, um verdadeiro teatro a céu aberto de culto a arte, beleza, cultura e fé; lembrei de São Sebastião que também foi escolhido pelo povo para abençoar a cidade, afastando-a da peste, da fome, da guerra, do infortúnio e, como bem afirmou o Padre Fabrício, houve a identificação com o homem do campo, da zona rural, fortalecendo esse vínculo. Com respeito e carinho pensei: Antiga Vila de Batalhão, Taperoá, aqui estou novamente. Padroeiros, minha benção; Frei Damião, um guia por seus caminhos.
Em uma das portas em madeira maciça, entro na Biblioteca e sou recebido por seu diretor, o querido amigo Valtécio Rufino que tanto bem tem feito não só aquela casa de leitura, como a cultura de toda a cidade. Funcionando no sobrado em que foi a prisão do personagem Quaderna na obra ‘O Romance d’A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta’ de Ariano Suassuna, hoje a antiga construção aprisiona estantes em que os livros emanam conhecimento e torna o povo livre. Sua criação remonta a longínqua quadra cronológica de 1941, época em que aquele calçamento em pedra não existia, era possível sentir a terra pedregosa e fofa por debaixo dos pés, nas proximidades do rio Taperoá. Converso com o amigo e Presidente do Borborema Cangaço Julierme do Nascimento. Bismarck Martins, Dário Machado, João Sousa, Pastor Pedrinho, José Tavares, Célia Maria e outros confrades se faziam presentes. O Prefeito George Ciro, Vereadores, Professores, ativistas culturais e pessoas interessadas preencheram os espaços daquele aconchegante lugar para ouvirmos o palestrante da noite, o amigo e confrade Marco di Aurélio.
Tomei assento, ouvi os pronunciamentos ao mesmo tempo que buscava enxergar conhecidos. Ocupei a última fila, a visão era privilegiada. Lá fora, a cidade se movimentava. Jovens ocupavam bares e lanchonetes em uma pura celebração da existência. Na biblioteca fazíamos o mesmo e vem Marco falar-nos da construção do humano, do que entende como o desenvolver dos povos de toda essa região semiárida. Fiz algumas reflexões, agradeci a Deus a oportunidade de novamente sentir o âmago do Mundo-Sertão, cartografia sentimental e prática que determina ações, relações e atuações do povo com a mãe terra. Recordei mais uma vez o amigo taperoaense Balduíno e o grande projeto de sua vida: a Universidade Leiga do Trabalho, um grito ao povo, um clamor às autoridades, uma formação para que as pessoas aprendessem na polivalência a viver em harmonia com autonomia sem precisar emigrar.
O Borborema Cangaço proporciona isso: cultura, memória e história possibilitando elucubrações. No fim da noite, antes do jantar, ouvimos a poesia de improviso de Humberto Guedes saudando os visitantes em verso. Taperoá é bela em todo o seu tracejado, muito bom estar ali novamente, momento de profundo aprendizado.
Thomas Bruno Oliveira
Historiador e Jornalista - 3372-PB

























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